27 março 2014

Cristina Areia

Costumo ver com alguma regularidade uma sósia da Cristina Areia. Até julgo que trabalha ao meu lado. A cara é igualzinha. Tem o cabelo mais escuro, o que é pouco mais que irrelevante, tamanha é a profusão de pinturas capilares que circulam por aí e que facilmente dão nova cor às senhoras, tornando morenas com complexos de inferioridade em louras de raízes escuras sem pingo de amor-próprio. Mas é muito mais atarracada, mais larga e não tem aquele par de mamas que celebriza a Cristina. É aqui que a porca torce o rabo.

Ah, a Cristina Areia, um mamalhal nacional e natural, capa da Playboy e tudo. Até pensaram em fazer um filme, intitulado “Who Wants To Be Cristina Areia?”, substituindo o John Malkovich original e simplificando o enredo: Cristinas Areias surgiam em pop-up por todo o lado com as mamas ao léu, ao som de uma música gemida especialmente para o efeito pelo Pedro Abrunhosa. Às vezes só mesmo as mamas é que apareciam. É porque quando falamos em Cristina Areia só visualizamos mamas e por isso poderia reduzir-se a redundância aqui e ali ao longo de uma hora e meia de projecção. E depois haveria um paneleiro tipo Goucha a abrir a boca de espanto para a comic relief. Apenas isso. Já houve filmes piores, como todos aqueles em que a Soraia Chaves entra e não mostra as mamas. Seria um pedaço de entretenimento fantástico, mas houve um desentendimento de verbas com os produtores, a mama esquerda da Cristina julgou que deveria ganhar mais x% que a mama direita, porque estava ligeiramente menos descaída e possuía uma auréola mais geométrica, bem como um mamilo mais eriçado, e o projecto abortou, deixando ao soutien da Cristina o ónus de aturar duas mamas desavindas. Não brinquem com aquelas mamas, aqueles seios têm personalidade, talvez mesmo jurídica, e são eles que determinam o que a Cristina deve fazer e não o contrário.

Esta sósia é, então, uma versão revista e diminuída da Cristina. Enferma de todos os problemas de ser clone da Cristina, como aquela carinha sonsa e aquela forma de colocar a boca quando fala coisas que ninguém tem paciência para ouvir, e de não ser simultaneamente assim tão parecida com a Cristina, como não ter um par de mamas tão avantajado e de ser claramente mais quadrada. É uma existência tramada. Saber que se é parecida naquilo que é acessório e não se é parecida naquilo que poderia fazer a diferença junto da população masculina. Isto é, partindo do pressuposto que ela reconhecer-se-ia como sósia da Cristina, o que é duvidoso. Talvez o melhor para ela seja viver na ignorância. Viver na ignorância, aliás, é condição necessária e por vezes suficiente para ser feliz. Mas também não acredito que ninguém à volta dela não tenha reparado naquela semelhança indiscutível.

Esta sósia sai de casa de manhã, faz sinal para apanhar o táxi e o taxista “eh lá, eu conheço aquela boazona!”, vai todo lampeiro da faixa esquerda à faixa direita para apanhá-la, ignorando as buzinas e as velhotas que atravessavam na passadeira e que por um triz não levaram com a estrela do Mercedes no meio das ancas, e depois pensa com os seus botões “espera lá, ou esta gaja comeu dois hipopótamos ou não é a gaja que eu pensava…”. E não era, efectivamente. Nem o dinheiro da corrida lhe satisfaz, tamanho o desapontamento. Depois ela está no trabalho e todos os gajos querem ver o que está abaixo do pescoço, que não conseguem ver por estar tapado pelo monitor. E todos eles conjecturam “eh pá, está ali o canhão da Playboy!” “Quem?” “A gaja que saltava para a piscina e é filha doutro gajo que é actor!” “Ah!” “Deixa ela levantar-se…”, até que quando ela se levanta para comer frutinhas e cereaiszinhos  e essas coisinhas que as gajas comem com pavor de engordar o pessoal tem logo ali a maior decepção do dia. “Ah, é apenas uma gorda com cara de Cristina Areia…”. E o pior é que mesmo com as frutinhas e cereaiszinhos e essas coisinhas todas ela vai continuar a engordar. E quando chega a altura de ir para casa, o marido tem vontade de fazer alguma coisa quando vê a cara dela no intercomunicador, mas mal ela chega ao pé dele o sorriso esfuma-se. Ele depois pensará na verdadeira Cristina Areia, ou até na Cláudia Jacques ou na Dora, quando estiver por cima dela e não ousará olhar para baixo do pescoço dela, porque já sabe a decepção que isso produz. E ela não percebe bem porquê, mas toda a gente com quem se relaciona parece estar desiludida com ela. Como não percebe as coisas, desata a ver séries de gajas ao mesmo tempo que enfarda frutinhas e cereaiszinhos e essas coisinhas todas como se fosse uma ursa acabada de sair da hibernação. Para depois engordar ainda mais e metamorfosear-se num clone da Cass Elliot – era a gorda dos The Mamas & The Papas, para vossa informação. Sim, esses do “California Dreamin’”. Caraças, era esta -> http://en.wikipedia.org/wiki/Cass_Elliot

O que lhe vale é que ela deve ser uma jóia de pessoa, por muito irrelevante que isso seja quando o tópico em discussão é a parecença com as mamas. Perdão, Cristina Areia.