Costumo ver com alguma regularidade uma sósia da Cristina Areia.
Até julgo que trabalha ao meu lado. A cara é igualzinha. Tem o cabelo mais
escuro, o que é pouco mais que irrelevante, tamanha é a profusão de pinturas
capilares que circulam por aí e que facilmente dão nova cor às senhoras, tornando morenas com complexos de inferioridade em louras de raízes escuras sem pingo de amor-próprio. Mas é muito
mais atarracada, mais larga e não tem aquele par de mamas que celebriza a
Cristina. É aqui que a porca torce o rabo.
Ah, a Cristina Areia, um mamalhal nacional e natural, capa da
Playboy e tudo. Até pensaram em fazer um filme, intitulado “Who Wants To Be
Cristina Areia?”, substituindo o John Malkovich original e simplificando o
enredo: Cristinas Areias surgiam em pop-up por todo o lado com as mamas ao léu,
ao som de uma música gemida especialmente para o efeito pelo Pedro Abrunhosa.
Às vezes só mesmo as mamas é que apareciam. É porque quando falamos em Cristina
Areia só visualizamos mamas e por isso poderia reduzir-se a redundância aqui e
ali ao longo de uma hora e meia de projecção. E depois haveria um paneleiro tipo
Goucha a abrir a boca de espanto para a comic relief. Apenas isso. Já houve
filmes piores, como todos aqueles em que a Soraia Chaves entra e não mostra as
mamas. Seria um pedaço de entretenimento fantástico, mas houve um
desentendimento de verbas com os produtores, a mama esquerda da Cristina julgou
que deveria ganhar mais x% que a mama direita, porque estava ligeiramente menos
descaída e possuía uma auréola mais geométrica, bem como um mamilo mais
eriçado, e o projecto abortou, deixando ao soutien da Cristina o ónus de aturar
duas mamas desavindas. Não brinquem com aquelas mamas, aqueles seios têm personalidade,
talvez mesmo jurídica, e são eles que determinam o que a Cristina deve fazer e
não o contrário.
Esta sósia é, então, uma versão revista e diminuída da Cristina.
Enferma de todos os problemas de ser clone da Cristina, como aquela carinha
sonsa e aquela forma de colocar a boca quando fala coisas que ninguém tem
paciência para ouvir, e de não ser simultaneamente assim tão parecida com a
Cristina, como não ter um par de mamas tão avantajado e de ser claramente mais
quadrada. É uma existência tramada. Saber que se é parecida naquilo que é
acessório e não se é parecida naquilo que poderia fazer a diferença junto da
população masculina. Isto é, partindo do pressuposto que ela reconhecer-se-ia
como sósia da Cristina, o que é duvidoso. Talvez o melhor para ela seja viver
na ignorância. Viver na ignorância, aliás, é condição necessária e por vezes
suficiente para ser feliz. Mas também não acredito que ninguém à volta dela não
tenha reparado naquela semelhança indiscutível.
Esta sósia sai de casa de manhã, faz sinal para apanhar o táxi e o
taxista “eh lá, eu conheço aquela boazona!”, vai todo lampeiro da faixa
esquerda à faixa direita para apanhá-la, ignorando as buzinas e as velhotas que
atravessavam na passadeira e que por um triz não levaram com a estrela do
Mercedes no meio das ancas, e depois pensa com os seus botões “espera lá, ou
esta gaja comeu dois hipopótamos ou não é a gaja que eu pensava…”. E não era,
efectivamente. Nem o dinheiro da corrida lhe satisfaz, tamanho o desapontamento.
Depois ela está no trabalho e todos os gajos querem ver o que está abaixo do
pescoço, que não conseguem ver por estar tapado pelo monitor. E todos eles
conjecturam “eh pá, está ali o canhão da Playboy!” “Quem?” “A gaja que saltava
para a piscina e é filha doutro gajo que é actor!” “Ah!” “Deixa ela
levantar-se…”, até que quando ela se levanta para comer frutinhas e
cereaiszinhos e essas coisinhas que as
gajas comem com pavor de engordar o pessoal tem logo ali a maior decepção do
dia. “Ah, é apenas uma gorda com cara de Cristina Areia…”. E o pior é que mesmo
com as frutinhas e cereaiszinhos e essas
coisinhas todas ela vai continuar a engordar. E quando chega a altura de ir
para casa, o marido tem vontade de fazer alguma coisa quando vê a cara dela no
intercomunicador, mas mal ela chega ao pé dele o sorriso esfuma-se. Ele depois
pensará na verdadeira Cristina Areia, ou até na Cláudia Jacques ou na Dora,
quando estiver por cima dela e não ousará olhar para baixo do pescoço dela,
porque já sabe a decepção que isso produz. E ela não percebe bem porquê, mas
toda a gente com quem se relaciona parece estar desiludida com ela. Como não
percebe as coisas, desata a ver séries de gajas ao mesmo tempo que enfarda
frutinhas e cereaiszinhos e essas
coisinhas todas como se fosse uma ursa acabada de sair da hibernação. Para
depois engordar ainda mais e metamorfosear-se num clone da Cass Elliot – era a
gorda dos The Mamas & The Papas, para vossa informação. Sim, esses do
“California Dreamin’”. Caraças, era esta -> http://en.wikipedia.org/wiki/Cass_Elliot